Mano Mascarado: Z-O, o processo e algumas notícias

 


Poucos de vocês sabem, mas eu tenho uma newsletter no Substack, que criei em 2023 pra falar sobre meus projetos e coleções. Você pode assinar gratuitamente a newsletter pra receber meus textos no e-mail e não depender de links esporádicos nas redes sociais! Vou abrir uma exceção no gênero dos posts aqui no blog para falar do processo de Mano Mascarado: Z-O, que será lançado pela Z Edições em formato de pré-venda nos próximos dias. Segue o post!


[Originalmente publicado no substack, em dezembro de 2024]

Confesso que esperava uma recepção melhor em Z-O, mas não estou podendo reclamar do que ouço e leio me falarem sobre a história. Afinal, hoje é muito mais difícil divulgar um trabalho novo entrando em um novo segmento artístico, quando se está profundamente identificado com outro. Ainda assim, tem sido esse o meu propósito nesse ano, dar o primeiro passo nos quadrinhos, aprender, estudar e produzir, porque o resto é consequência.

Um ano atrás, eu escrevia um post comentando sobre a primeira parte divulgada da história, que equivalia ao prólogo. Ou seja: tudo aquilo que Caio Muto era antes de virar Z-O. Com o tempo, e isso me ocorreu rápido demais, teria de contar a história de maneira mais eficiente, passando menos por detalhes e mais por arcos que realmente afetam a narrativa central. Para isso, também precisei criar personagens que não estavam exatamente nos planos quando tive a primeira ideia, juntamente com o Thor Sanchez (coautor do personagem). E foi aí que o bicho pegou.

Página cortada que fazia parte, originalmente, do prólogo. Diálogo entre Jonathan e Caio

Vou dar um exemplo prático sobre o tipo de coisa que mudou do prólogo até aqui. Na página acima, percebi que seis quadros por página, apenas com diálogos, eram bastante cansativos e não acrescentavam tanto assim à história. (Valeu, William, jamais esquecerei). Além disso, outras questões de falta de preparo vieram à superfície. Não trabalhei tão bem o design dos personagens e isso fez com que aparecessem versões diferentes deles ao longo da campanha. Lá atrás, o traje de Z-O era um pouco diferente, assim como a Treteira, sua moto e fiel companheira. Acabei simplificando e deixando alguns detalhes mais autorais pra me distanciar da fonte de inspiração, o Kamen Rider.

Primeira vez que desenhei Z-O: ele tinha um visual bem mais motoqueiro e com as cores alusivas ao Kamen Rider Black. A homenagem me parecia muito pouco original e acabei abandonando



Esboço de Z-O com a obra já em andamento


Eu até gostava desse traje, mas meio complicado de desenhar de maneira recorrente

Quando falei de não trabalhar tão bem o design, o Jonathan é o principal exemplo disso. Ele era de um jeito no prólogo (cortado do fluxo final da HQ) e de outro nos capítulos do arco principal. Por quê? Espelhei ele pensando em uma referência e descobri depois que poderia ser fácil confundí-lo com o Pedro Paulo.


Optei na versão final por um personagem mais retinto, mais robusto e de corte de cabelo curto, com um suéter, não uma blusa de capuz e bolso canguru. Os macacões dos entregadores também mudaram, ainda que sutilmente, porque eu notei que não havia desenhado o modelo o suficiente. E como tudo é questão de prática, eventualmente cheguei à versão final: proteção no ombro, nos cotovelos, luvas menores e mais justas, e zíper que percorre todo o tronco.


Já os trajes dos gafanhotos, esses sim foram os mais divertidos. Queria algo que fosse coerente, mas não idêntico para todos. De forma que a pessoa consiga reconhecer pelo capacete qual personagem está em foco. Não era para a Zila ter cabelinhos saindo do casco dela, mas gostei tanto da proposta que acabei mantendo. E a Zuri é a única que não tem nenhuma inscrição no peito, justamente por ter duas letras Z espelhadas nos painéis na região do tórax. Coerente, mas não idêntico.



Em vez de pensar no que eu estava fazendo de errado (ainda faço, na verdade), comecei a olhar para que vinha dando certo. Mesclar a minha técnica de desenho com um conto bem longo e depois propor outras abordagens foi mais difícil do que imaginava. Sobretudo em sair do formato basicão de cabecinhas conversando para cenas com ação, movimento e luta, tensão nos gestos corporais. Mas complicado, mesmo, foi encaixar a construção da HQ enquanto tinha outras coisas pra fazer, trabalho, projetos e faculdade. Muitas semanas me trouxeram agonia porque embora sobrasse inspiração e ideias para fazer as páginas, faltava tempo. E por esse motivo, o trabalho que seria de meses se estendeu para mais de um ano. Faz parte.

Processos e aprendizado

Piada alusiva à introdução de Kamen Rider Black, que fazia parte do prólogo e foi cortada da versão final

Lá atrás, escrevi um roteirão que tinha 15 partes. No meio do caminho, percebi que seria melhor contar em dez, mas com mais páginas em cada. Até cheguei a publicar páginas no instagram, só que com o alcance vergonhoso que tenho, não deu certo. Eis que tive a sacada do blog para publicar tudo, e quem quisesse ler com facilidade todas as partes, era só clicar. Vejo muitos problemas na obra, ainda, mas resolvi cada um deles da melhor forma possível em cada momento. E ainda farei alterações sutis (e estéticas) até a versão final, impressa, pra limar todas as páginas que tiverem algo que eu ainda considere “feio” ou “mal feito”. Muitas aspas aqui.

De todos os feedbacks que recebi até agora, acho que os que mais me deixaram feliz foram os que reconheceram a evolução técnica e as soluções que criei em determinados pontos. Mas também precisei mexer em muitos detalhes por conta de conselhos de outras pessoas, e foram justamente com esses que eu mais aprendi, afinal, eles contemplam coisas que não vejo enquanto produzo. Nesse processo de ler gibis de vários gêneros e vários autores, acabei criando uma biblioteca de imagens bacana na mente. E claro, ter começado a fazer um curso durante a obra também ajudou. 

E aí chego a esse ponto crucial. Faltam uma ou duas dezenas de páginas, pra dar a tinta no último capítulo desse primeiro volume. O trecho que tanto esperei para acontecer, que é o que encerra o nono capítulo, é a pedra fundamental da história desde o começo, um pilar que eu e Thor consideramos intocável no desenvolvimento.

Antes, era tudo um amontoado de ideias legais e coerentes. Mas eu só aprendi a encaixar essas peças com mais cuidado da sétima parte em diante. Por esse motivo, cada capítulo do roteiro acabou sendo alterado, outras partes foram cortadas para dar maior fluência e assim por diante. O final, diga-se de passagem, teve quatro versões. O que considero importante é responder todas as grandes perguntas que ficaram até aqui. Como por exemplo o plano mal-sucedido da Zila com Ryan, a tornozeleira do PP (isso será respondido no último capítulo), o sonho realizado dos CEOs no Plano FRAG e também a posição de Ricardo depois dos acontecimentos com Julio e Fred em reunião.

Jamais esperava escrever toda a história e seguir exatamente aquele caminho até o final. Eu adoro um improviso e com quadrinhos não seria diferente. Sempre surge uma ideia melhor na hora de botar no papel. Muito por ser chato com reviravoltas em outras obras, acho que estou prestes a entregar algo legal, satisfatório e que deixe o público pensando, sem poder enumerar tantos buracos ou situações mal-explicadas. Nem por isso deixo de analisar que poderia ter mais cuidado com determinados pontos. Com o passar do tempo, também ganhei o auxílio valioso do amigo Vitor Camargo, leitor de Z-O e de centenas de mangás, uma enciclopédia viva. É com ele que tenho batido cada ideia maluca há alguns meses.

O segundo volume terá um carinho maior com as histórias de cada personagem (alguns feitos em colaboração com o Vitor), não só a narrativa à qual eles atendem. E por isso estou tão ansioso para ver isso tudo publicado. É certamente um pequeníssimo passo para a humanidade, já que o cenário de quadrinhos brasileiro tem muitas e muitas feras (as quais faço questão de apoiar). Mas para quem há vinte anos deixava o desenho de lado para entrar num limbo quase infinito, Z-O é uma resposta bastante contundente. Acho que passei tempo demais fingindo que não gostava das séries e desenhos que amei durante a infância. Assim sendo, Z-O é um recomeço que me deu muita força pra seguir adiante e me reconectar com o passado, também.

E se ainda não ficou claro, eu escrevo com todas as letras. Rico é tudo filho da puta mesmo. Queria expor todo esse cinismo, essa demagogia, essa obsessão imbecil com a maximização dos lucros. É sobre dinheiro, ganância, exploração, e reação da classe trabalhadora. Porque além do dinheiro não significar nada em longo prazo além de números, ele esmaga tudo que vem embaixo.

Comecei essa HQ com muito ódio no coração e uma revolta específica. Após nove capítulos, eu estou mais revoltado ainda, de maneira ampla, e incendiado por acontecimentos importantes da vida real. Então, acho que houve avanço, sim. A nossa resposta não pode mais ser a de aceitar isso tudo. Lutar não é só sair dando soco e chute. É usar as armas que temos, como o não. O dia que a classe trabalhadora descobrir o poder do não, meus amigos… 

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